quinta-feira, 21 de julho de 2011

À procura do mestre

Por mais que eu não tenha me adaptado ao retiro espiritual, saí de lá com vontade de ter um guru. Para um hippie, ter um mestre, é como para um economista ser pós-doutor – em Harvard.

Como eu nunca tinha lido a galera do Oriente, decidi falar com o cara do vestidão, que tinha um papo complicado, mas com toda cara de coisa importada.

Num intervalo de aula, fui procurar o homem. Ele estava - como de costume - no meio do pátio com mais cinco amigos, todos de sunga, fazendo uma posição de yoga que parecia mistura de auto-kamasutra com quero-suruba-já. Fiquei receoso. Poderia atrapalhar a comunicação deles com o todo; interromper o fluxo de respiração essencial para a ligação cósmica; ou pior, poderiam me convidar para participar da farra.

Quando o tempo do lanche estava no fim, tomei coragem. Cheguei devagar: calculando no passo e medindo na respiração. Eles haviam mudado a posição, agora parecia mais não-me-empurra-que-caio misturado com olha-que-te-ataco.

— Licença. Não querendo interromper, mas tô atrás de algumas informações sobre o grande... o grande, — como era mesmo o nome do guru? — aquele indiano bacana, do amor da consciência e todas aquelas coisas importantes. O Karacharchara?

Desconfiei que tinha errado o nome, porque um cara que estava lá atrás caiu um tombo, me olhou com cara feia e disparou:

— O grande Karaschinanabanda?

Fiquei constrangido. Decidi mostrar que eu não era um completo ignorante nas questões metafísicas. Já tinha estudado um pouco das coisas espirituais: tinha feito catequese, e na igreja de Lavras - pessoal ortodoxo. Lá a rapaziada também falava de amor. Eu sabia bem que Jesus Cristo tinha falado que a paz devia reinar entre os homens e...

No meio do papo vi que dois magros perderam a concentração e caíram, os dois ao mesmo tempo. Eu devia estar impressionando. Decidi não deixar nenhum de pé:

— Vocês talvez conheçam aquela passagem que Jesus manda ninguém atirar pedra na Madalena, que era sem vergonha, claro, mas também era gente. Ali ele mostra que a galera tem que se amar. — Puft. Derrubei mais um com essa, eu estava inspirado, só faltava o do vestidão. — E não podemos esquecer aquela outra passagem, a do vinho, que o cabeludo regou a festa a trago. O que é isso? Amor, amor verdadeiro ao próximo!

O sujeito seguia concentradíssimo.

Não queria entregar meus pontos. Como o conhecimento bíblico tinha chegado ao fim, arrisquei:

— Tem aquela frase, também, que resume tudo: “Mesmo que eu falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria”. Isso aí é da Bíblia. E diz tudo!

Bingo! O cara não resistiu: desequilibrou e foi pro chão. Fiquei olhando pra ele com cara de entendido. Combinamos uma conversa sobre o guru para o dia seguinte.

Nenhum comentário:

Postar um comentário