quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Maria Paula (a traição)

- Porra, Paulinha, como assim ficou com outro cara? - entre uma baforada e outra num baseado ela contava que tinha ficado com o Tonho.

- Cara, fiquei. - agora ela me chamava de cara - Não sabia que tu ias te indignar. E os teus ideais?

- Paula, primeiro, para de me chamar de cara; segundo, eu não estou indignado, eu só estou.... - Não encontrava palavras para descrever meu estado. Estava em choque, apavorado; quase chorando.

- Cara, te acalma, achei que tu ias levar numa boa. Rolou uma química entre nós e acabou acontecendo, foi só! Desculpa!

- Desculpa? Maria Paula, a gente pede desculpa se pisa no pé de alguém, se esbarra na rua, mas não quando tu metes um corno na pessoa.

- Bom, Ricardo, não tem o que fazer. Dei e ponto!

- Para de falar esta palavra!

- Qual? Cara?

- Não.

- Dei?

- Porra, Maria Paula, chega!

- Cara, nunca imaginei. Que caretice!

Maria Paula

Eu falhei como hippie, já disse isso. É um pouco repetitivo, mas alguns fracassos foram tão contundentes que essa frase não me sai da cabeça. Foi o caso da Maria Paula.

A Maria Paula fazia Letras no prédio do lado da Filosofia. Ela passava todo dia, era uma graça: cabelo comprido, liso, óculos; magra com corpão.

Na primeira vez que a gente conversou fiquei apaixonado: ela fazia o tipo certinha, tinha tido um namorado durante 5 anos e acabado o namoro há seis meses. Era do interior e cheia de ideias sobre casamento e filhos - queria terminar a faculdade o mais rápido possível para começar a trabalhar numa editora.

Desde o começo do namoro eu gostava de chocar a Maria Paula. Usava algumas frases de efeito, só para experimentar a indignação dela.

- Maria Paula, isso é lei. Homem não bate punheta pensando na namorada. É uma regra: a masturbação masculina é infiel!

- Ricardo, que horror!

- Paulinha, quer monogamia? Casa com um cisne! Eles trepam com um parceiro a vida inteira, e acho que não batem punheta!

- Ricardo, como tu és! Tu falas pelos homens. Mulher não é assim!

- Querida, como diz meu tio Nestor: mulher, quando quer te trair, tu trancas no armário e ela trepa com o cabide! Não tem jeito!

-  É muita modernidade para mim, Ricardo!

 - Tu és muito apegada aos valores de pequena burguesa. Tomar uma pessoa como propriedade privada: um absurdo!

Ela ficava chocada. Achava que eu era um grande filósofo, um pensador revolucionário.

Eu falava isso tudo porque tinha certeza que a Paulinha nunca seria capaz de trair. Os pais dela eram casados há 50 anos e diziam que eram felizes. Era mentira - óbvio - mas a Paulinha acreditava.

Com o tempo ela passou a aceitar melhor as ideias: começou a frequentar as festas da filosofia, bebia bastante, fumava maconha e até largou os óculos. Por via das dúvidas, parei de teorizar. Já era tarde.