sexta-feira, 11 de março de 2011

Mão de vaca

Gastar dinheiro é coisa de burguês. Hippie que é hippie vive na unha, longe da sociedade de consumo. No tempo de faculdade isso era bom; dinheiro nunca sobrou lá em casa. 

Enquanto eu estava no colégio o tênis velho que eu usava era motivo de tiração de sarro, na faculdade era sinal de resistência. Para a mãe foi um alívio: passei quase quatro anos sem pedir uma roupa nova, sobrava mais pra ela.

Na faculdade tinha uma turma - dos radicais - que ficava incomodando cada vez que eu ia comprar alguma coisa no bar. 

- Olha aí, já vai o Rica estimular o capitalismo e a ganância dentro da faculdade. Tu começas comprando neste bar, depois quer almoçar aí e por fim estão construindo um restaurante aqui no meio do Campus. 

- Por favor, vou comprar um pastel e um refri. Ninguém vai construir nada com os três reais que eu vou gastar. 

- É assim que começa. Por que tu não compras um pastel da Drica?

Os pasteis da Drica eram uma merda. Ela fritava os pasteis em casa para vender na faculdade. Chegavam moles, frios e enrolados num guardanapo que grudava inteiro no pastel.

O pior é que não adiantava tentar fugir dos pasteis dela, ela pressentia quando eu estava querendo comprar comida e aparecia do nada - estava sempre à espreita. Eu achava que ela era a maior capitalista do mundo vestida com saia comprida e camiseta florida. Sentia o cheiro do meu dinheiro!     

Uma vez fui ao cinema com ela. Não lembro porque entrei nesta roubada, sei que estava com aquela figura no meio do shopping. A Drica com uma das camisetas floridas até o joelho, saia comprida até a canela e uma rasteirinha; eu de camiseta com gola rasgada, calça jeans cortada na barra e alpargatas - uma bela dupla.      

Logo de início a mulher mostrou a que veio e arranjou uma confusão na bilheteria, porque não queriam dar 50% de desconto para estudantes. Disse que ia chamar advogado, colocar na justiça, pediu o regulamento do cinema - tanto fez que ganhamos o desconto. Eu fiquei feliz, com aquele desconto dava para comprar uma pipoca e um refri. Fui me encaminhando para a bomboniere do cinema quando ela me segurou pelo braço:

- Onde tu pensas que vai?

- Vou comprar uma pipoquinha pra nós. Afinal, agora sobrou uma verba.

- De jeito nenhum, esta pipoca é um crime, assalto à mão armada. Deixa comigo! Entra no cinema. 

Fui resignado, mas me queixando. A Drica sentou, me olhou e deu uma piscadela. Tirou de dentro da bolsa um saco de pipoca de microondas pronta. 
Fiquei perplexo.

Claro que aquele negócio feito no microondas há mais de duas horas já estava mole, frio e sem sal. Comi para não fazer desfeita.
No final da sessão ela ainda teve a cara de pau de me pedir uma contribuição pelo piquenique.    

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