quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Professor

Eu dou azar até quando caio na sorte.

Foi assim quando decidi fingir que estava buscando emprego: fui à Secretária de Educação e me inscrevi para o estágio como professor substituto. Corria na boca pequena que era jogo ganho: a chance de ser chamado era nula. Escolhiam dez de quinhentas; o principal critério era o currículo, com a minha experiência de trabalho eu estava tranquilo.

Bolei o plano: fazia a inscrição, mostrava aquela expectativa em casa e depois, quando não fosse chamado, desilusão total – até poderia reclamar do País, que não dava oportunidade para o jovem.

Cheguei fazendo alarde:

- Mãe! Chega de moleza. Me inscrevi para ser professor substituto no Município. Quero ajudar no quadro social.

- Mas, meu filho, escola municipal não é perigosa?

- Mãe, o importante é o trabalho. O trabalho dignifica o homem - eu estava com tudo – vou avisar o pai!

Ela ficou orgulhosa, liguei para o velho no mesmo dia.

- Isso aí, pai. Estamos na disputa, torcendo. Tem que ter fé! É concorrido, mas com meu currículo, quem sabe?

- Colocou no teu currículo o trabalho aqui no Hiposul?

- Que Hiposul, pai. Ficou maluco?

- Ricardo, caso tu não sabias, vendedor é um tipo de professor. Ele ensina o que é melhor para comprar.

- Sem briga, torce por mim.

Foi a semana mais sossegada do tempo de faculdade. O pai ligava de dois em dois dias e a mãe era só mimos. Tudo uma beleza, até que tocou meu celular:

- Alô, Ricardo Monteiro? Aqui é da Secretaria de Educação, estamos ligando pela tua inscrição para o estágio como professor.

Fiquei ligeiramente tonto.

- Tu conseguiste a vaga, Ricardo.

Sentei, a panqueca de espinafre do almoço subiu até o peito.

- Aqui consta que tu vais lecionar pela manha, das 07h30min às 12h30min, para que tu possas estar na faculdade de tarde. Confere?

O pudim terminou de empurrar a panqueca, quase vomitei. Pensei: vou recusar. Mas a mãe estava parada na minha frente e quando viu minha cara de espanto atirou a pergunta:

- É da prefeitura? – Intuição materna é foda!

Fiz que sim com a cabeça; ela me pegou desprevenido.

- Conseguiste a vaga?

Fiz outro gesto afirmativo. Ela saiu pulando, vibrava, me deu beijos. Saiu correndo pela casa, ouvi os gritos lá dos fundos:

- Eu vou ligar para a tua avó. Avisa teu pai. Parabéns, meu filho!

Minha vida terminava ali!

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