Eu dou azar até quando caio na sorte.
Foi assim quando decidi fingir que estava buscando emprego: fui à Secretária de Educação e me inscrevi para o estágio como professor substituto. Corria na boca pequena que era jogo ganho: a chance de ser chamado era nula. Escolhiam dez de quinhentas; o principal critério era o currículo, com a minha experiência de trabalho eu estava tranquilo.
Bolei o plano: fazia a inscrição, mostrava aquela expectativa em casa e depois, quando não fosse chamado, desilusão total – até poderia reclamar do País, que não dava oportunidade para o jovem.
Cheguei fazendo alarde:
- Mãe! Chega de moleza. Me inscrevi para ser professor substituto no Município. Quero ajudar no quadro social.
- Mas, meu filho, escola municipal não é perigosa?
- Mãe, o importante é o trabalho. O trabalho dignifica o homem - eu estava com tudo – vou avisar o pai!
Ela ficou orgulhosa, liguei para o velho no mesmo dia.
- Isso aí, pai. Estamos na disputa, torcendo. Tem que ter fé! É concorrido, mas com meu currículo, quem sabe?
- Colocou no teu currículo o trabalho aqui no Hiposul?
- Que Hiposul, pai. Ficou maluco?
- Ricardo, caso tu não sabias, vendedor é um tipo de professor. Ele ensina o que é melhor para comprar.
- Sem briga, torce por mim.
Foi a semana mais sossegada do tempo de faculdade. O pai ligava de dois em dois dias e a mãe era só mimos. Tudo uma beleza, até que tocou meu celular:
- Alô, Ricardo Monteiro? Aqui é da Secretaria de Educação, estamos ligando pela tua inscrição para o estágio como professor.
Fiquei ligeiramente tonto.
- Tu conseguiste a vaga, Ricardo.
Sentei, a panqueca de espinafre do almoço subiu até o peito.
- Aqui consta que tu vais lecionar pela manha, das 07h30min às 12h30min, para que tu possas estar na faculdade de tarde. Confere?
O pudim terminou de empurrar a panqueca, quase vomitei. Pensei: vou recusar. Mas a mãe estava parada na minha frente e quando viu minha cara de espanto atirou a pergunta:
- É da prefeitura? – Intuição materna é foda!
Fiz que sim com a cabeça; ela me pegou desprevenido.
- Conseguiste a vaga?
Fiz outro gesto afirmativo. Ela saiu pulando, vibrava, me deu beijos. Saiu correndo pela casa, ouvi os gritos lá dos fundos:
- Eu vou ligar para a tua avó. Avisa teu pai. Parabéns, meu filho!
Minha vida terminava ali!
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