terça-feira, 16 de novembro de 2010

O Chato

mictorio22

O chato é uma espécie que não está em extinção. Existem desde o começo da humanidade e marcarão presença no fim. Dão palpites há milênios: estavam lá quando o homem descobriu o fogo, dizendo para não misturar com água; estavam lá quando o homem pisou na lua, avisando, “O pé direito, pisa primeiro com o direito!!”; e estavam, aos montes, na minha faculdade.

Quando o chato assume uma ideologia ele fica insuportável. Na universidade tinha muito chato que virou hippie. Era um pessoal que falava manso, mostrava um olhar profundo e, quando encontrava conhecido, dava aquele abraço demorado encostando todo o corpo.

O pior de todos era o Rangel - ele era completo: sabia tudo, interrompia qualquer conversa para dar explicações e amava todos os seres da terra. O pior chato é o afetuoso.

O Rangel estava sempre falando do cosmos, da energia e tentando mostrar os benefícios da meditação. Quando avistava um conhecido, não exitava: levantava e ia até lá dar um grande abraço; perguntava como a pessoa estava e oferecia uma série de conselhos - sempre olhando nos olhos, com os dedos cruzados na frente do corpo, como se estivesse rezando. Era um mala!

O meu pior encontro com o Rangel aconteceu num banheiro. Quando eu entrei, ele já estava lá. Havia dois mictórios, um bem pertinho do outro. Pela quantidade de cerveja que eu tinha tomado, não ia dar para segurar. Me aproximei, pedi licença e tentei mijar. Todo homem sabe que não é fácil mijar em mictório, ainda mais um grudado no outro. Às vezes, o mijo tranca. Tentei concentrar, estava quase conseguindo, quando o Rangel deu um gemido:

- Ahhhh, que beleza. É a energia reciclando! Pode sentir isso, Rica?

- Tentando.

- Concentra, Rica, concentra. Um prazer que só a cerveja dá. Este mijo infinito. Alterna, faz o fluxo ficar mais forte - ouvi o barulho do mijo do Rangel bater mais forte na laje do mictório- agora, segura, diminui a intensidade, até terminar.

Ele terminou, olhou para mim, colocou a mão no meu ombro (ele ainda não tinha lavado a mão) e disse:

- Que experiência que nós compartilhamos, companheiro!

- Rangel, eu não mijei ainda.

Ele olhou fundo nos meus olhos, fez cara de compreensivo e incentivou:

- Força, companheiro.

O homem era um chato, mas era um gênio: conseguia inspirar fundo, falar e mijar ao mesmo tempo. Eu não conseguia nem mijar.

3 comentários:

  1. muito legal... mas acho que eu tbm sou chata às vezes, hahahaha =)

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  2. Mariana,
    Pelos textos tu podes imaginar o quanto eu sou chato....
    abraços.

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  3. Chato é bom, por que não rola...

    Tá em ascendente de novo, professor. Bom demais.
    Abraço

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